Quando você não conversa sobre recaída com seus pacientes, aumenta a chance de eles desistirem do processo de mudança.
Um lapso é um evento isolado em que o indivíduo desvia do comportamento esperado (por exemplo, quando uma pessoa que parou de fumar fuma um cigarro e não retoma o hábito de fumar). Já a recaída acontece quando uma pessoa que realizou uma mudança de comportamento volta a repetir o comportamento antigo de maneira contínua.
A recaída é um acontecimento extremamente comum em qualquer processo de mudança. Aproximadamente 70% irão ter uma recaída dentro de 6 meses e 80% dentro de um ano; em média, uma pessoa realiza de 3 a 7 tentativas de parar de fumar antes de realmente conseguir ficar livre do cigarro.
As terapias de prevenção de recaída foram elaboradas, a princípio, para programas de cessação de tabagismo e consumo abusivo de álcool, mas atualmente existem programas direcionados especificamente para transtornos alimentares e obesidade, e existem muitas estratégias que podem ser utilizadas para prevenir recaídas em qualquer programa de mudança de hábito.
O plano de prevenção de recaída é construído em parceria com o cliente, pois é ele que vai conseguir identificar os determinantes da recaída. Eles podem ser divididos entre Determinantes Imediatos e Antecedentes Encobertos.
Os Determinantes Imediatos são aqueles mais claramente ligados ao momento do lapso. Deve-se fazer um levantamento dos seguintes pontos:
🛑 Situações de alto risco: Quais situações a pessoa identifica que o levam a recair. Situações onde a pessoa é exposta à substância, situações de risco elevado intrapessoais (pensamentos e emoções que podem fazer a pessoa buscar alívio no comportamento anterior) e interpessoais (relacionamentos conflituosos, pressão social direta, situações de convívio ou prazer como festas e outros encontros).
🧩 Estratégias de enfrentamento: Quais estratégias de enfrentamento a pessoa identifica que tem ou precisa desenvolver para lidar com as situações de risco. Quais estratégias para lidar com estados emocionais ou pensamentos desafiadores? Como buscar a resolução de conflitos ou melhorar a comunicação para não ter seu espaço invadido? Como se comportar em situações na qual seja esperado o comportamento antigo (como evitar a bebida em uma festa, o que irá dizer para as pessoas, por exemplo).
😌 Expectativa de gratificação: Existe a expectativa do alívio de um sofrimento ou um prazer ao usar a substância ou realizar o comportamento antigo. Essa expectativa anda junto com o adiamento das consequências negativas (como exagerar na comida pelo prazer ou alívio imediato, sem ponderar os malefícios para saúde e bem-estar no longo prazo). Deve-se discutir qual a expectativa de gratificação e pensar qual a necessidade para essa gratificação e se existe outro comportamento que poderia suprir essa necessidade.
🤔 Efeito de violação da abstinência: Conjunto de reações emocionais associadas aos pensamentos que surgem após a recaída. A pessoa pode sentir-se culpada ou envergonhada por não ter conseguido resistir à tentação e isso leva a pensamentos de que não é capaz de realizar a mudança. Quando a pessoa entra nesse tipo de atitude, existe uma grande chance de que um lapso (um evento pontual e momentâneo) se transforme realmente em uma recaída (quando o hábito antigo é retomado continuamente e a pessoa considera que não é capaz de realizar a mudança). Esse talvez seja o ponto mais importante a ser trabalhado com quem está realizando um processo de mudança. É importante ter em vista que trata-se de um processo e os lapsos são muito comuns. Devem ser interpretados como oportunidades de aprendizado, quais novos comportamentos ou estratégias de enfrentamento a pessoa precisa desenvolver para enfrentar com eficácia esse tipo de situação. É importante olhar como algo natural do processo, isso muda a atitude da pessoa frente ao acontecimento e a coloca no lugar de alguém que está em um processo de aprendizado e melhoria contínua e não num tratamento TUDO ou NADA onde um deslize significa incapacidade de atingir o objetivo final. Tudo isso deve ser comunicado à pessoa logo no início do processo para que quando aconteça, já exista a visão de que é algo natural e esperado e, além disso, qual o plano para não deixar que um lapso realmente torne-se uma recaída. Para a pessoa se perguntar, como retomar o caminho que estava sendo seguido até ali?
Antecedentes Encobertos envolvem forças que atuam de forma não consciente:
🌿 Estilo de vida: é preciso desenvolver um estilo de vida que diminua o estresse ou carga mental em geral. Muitos antecedentes encobertos envolvem uma desproporção entre as obrigações diárias e as gratificações pessoais. Uma percepção de muito mais obrigações está relacionada a uma sensação de privação, estados emocionais negativos e racionalização permissiva: depois deste esforço eu mereço uma bebida/cigarro/sorvete/assistir uma série de TV. Assim, é preciso desenvolver um estilo de vida equilibrado.
👥 Decisões aparentemente irrelevantes: aqui são tomadas várias decisões que não parecem trazer risco algum, mas que levam a uma situação na qual pareça impossível que a pessoa escolha algo diferente. Veja a história de Carlos. Carlos parou de fumar e realiza uma viagem para a praia com Felipe que ainda fuma, decidem dar uma volta e Felipe pede para deixar o cigarro no bolso de Carlos. Felipe então vai até o mar e ao voltar pede para que Carlos acenda o cigarro porque está com a mão molhada. É uma situação que poderia ter sido evitada, ainda mais se Carlos estivesse muito atento ao fato de que viajar sozinho com uma pessoa que fuma traz bastante risco para uma recaída.
Então, os passos para criação do plano de prevenção de recaída são:
Identificar e desenvolver estratégias para lidar com situações de alto risco: Estas estratégias são tanto do ponto de vista de comportamento quanto de habilidade de enfrentamento de estados emocionais e construção de relacionamentos saudáveis.
Controle de estímulos: Construir um ambiente que não promova o retorno ao hábito antigo. No caso de cigarro, seria retirar de dentro de casa qualquer objeto que remeta ao seu uso, como cinzeiros, isqueiros, maços de cigarro, etc.
Promover a autoeficácia: Autoeficácia é a percepção de que se é capaz de iniciar e manter algum comportamento, também diz respeito à percepção de que a pessoa é capaz de lidar com situações cada vez mais complexas conforme vai avançando no processo. A cada situação desafiadora enfrentada e superada, a pessoa sente-se mais capaz. Situações que a pessoa ainda não consegue lidar devem ser encaradas como oportunidades de aprendizado tanto do ponto de vista de se evitar a situação quanto de como lidar com ela caso aconteça de forma inesperada. Quanto mais envolvida e atuante no processo, mais a sensação de autoeficácia vai sendo desenvolvida.
Checagem cognitiva: Realizar checagem cognitiva dos efeitos do comportamento, ponderando os ganhos imediatos versus os prejuízos no longo prazo. Para ser relembrada no ponto de decisão entre o lapso e a manutenção na mudança.
Plano de retomada após o lapso: O que é preciso fazer assim que for percebido que o lapso aconteceu. Reavaliar quais estratégias preventivas não funcionaram ou porque não funcionaram e aprimorar. Reavaliar também se existem Determinantes Encobertos envolvidos no lapso para que também sejam controlados.
Construção de um estilo de vida saudável: Equilibrar as obrigações e gratificações. Além disso, procurar atividades saudáveis que auxiliem no manejo da sensação de excesso de obrigações que acabam trazendo estresse.
Mapa de recaída: esta é uma intervenção que acontece após o lapso ou recaída. É preciso reconstruir na memória os acontecimentos que levaram à recaída, retratando toda a sequência de acontecimentos e identificando as rotas (caminhos arriscados), comportamentos adotados e não adotados, alternativas possíveis, locais para inversão da rota da recaída e “becos sem saída”. Isso é particularmente interessante para identificar as decisões aparentemente irrelevantes, estar mais atento no futuro quando surgirem novamente e tomar medidas antecipadas para evitar estar no lugar de que não havia outra atitude a ser tomada.
Como pode ser visto, a construção de um plano de prevenção de recaída é um processo muito individualizado, não havendo uma regra única para todos, já que a própria pessoa precisa identificar cada um dos determinantes na própria história e como irá lidar com cada um deles. É também um processo muito importante de qualquer plano de mudança, já que a probabilidade maior é de que o lapso e a recaída irão acontecer. É preciso estar preparado para preveni-los e para que haja uma ação rápida para o retorno ao processo de mudança.
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